O Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) se encontra no centro de uma acalorada controvérsia sobre a composição de seu quadro de pessoal, com dados oficiais da própria instituição sendo contestados por entidades representativas dos servidores. A polêmica, que ganhou força após uma reportagem do jornal O Estado de S. Paulo apontar o órgão com uma alta proporção de comissionados em relação a efetivos, revela inconsistências numéricas e uma disputa sobre a política de pessoal que ameaça a meritocracia e a eficiência do serviço público.
A nota oficial do MPRN, emitida para rebater a reportagem que indicava 50,81% dos cargos como comissionados (543 comissionados para 465 efetivos), buscou apresentar "seus números oficiais" para tranquilizar a opinião pública. Segundo o órgão, o quadro seria composto por 195 membros, 439 servidores efetivos e 341 cargos exclusivamente comissionados (34%). A instituição afirmou que "possui mais servidores efetivos do que servidores exclusivamente comissionados" e destacou que 70,8% dos cargos de direção e chefia são ocupados por servidores do quadro.
No entanto, a Federação Nacional dos Servidores dos Ministérios Públicos Estaduais (FENAMP), a Associação Nacional dos Servidores do Ministério Público (ANSEMP) e o Sindicato dos Servidores do Ministério Público do Rio Grande do Norte (SindsempRN), dirigido pelo vereador de Natal, Aldo Clemente, reagiram com veemência, classificando a nota do MPRN como uma "tentativa de distorcer dados". As entidades reafirmam a precarização do quadro funcional e, baseadas em informações extraídas do próprio Portal da Transparência e de documentos oficiais do MPRN, apresentam uma realidade que torna a matemática do órgão questionável:
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Total de Comissionados: O MPRN afirma ter 341 cargos exclusivamente comissionados. As entidades de classe, citando informações oficiais de setembro, indicam que o número total de cargos comissionados é de 515.
- Vínculos Precarizados: Além dos 515 comissionados (muitos dos quais não são servidores de carreira), as entidades somam 339 trabalhadores terceirizados e 431 estagiários/MP Residentes. A soma desses vínculos precários (1.285) supera "com larga margem" o total de servidores concursados (439), confirmando a tese de precarização levantada pela reportagem inicial.
Em um outro ponto de atrito, o MPRN destaca que 70,8% dos cargos de direção e chefia são ocupados por efetivos. As entidades sindicais, no entanto, argumentam que o dado relevante é o percentual geral de ocupação de todos os cargos comissionados por efetivos, que em setembro passado era de apenas 30,12%, registrando uma tendência de queda (eram 30,97% em abril). A situação é ainda mais crítica no assessoramento jurídico, onde apenas 16% dos cargos de assessoria são exercidos por concursados.
Jabuti legislativo
A controvérsia numérica ganha contornos institucionais com a tramitação na Assembleia Legislativa do Projeto de Lei nº 23/2025, de autoria da Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ). O projeto, que também trata da reposição salarial (considerada baixa pela categoria), propõe reduzir de 30% para 20% o percentual mínimo de cargos comissionados a serem obrigatoriamente ocupados por servidores efetivos.
O SindsempRN, apoiado pelas federações nacionais, se posiciona veementemente contra essa redução, alegando que ela "amplia a precarização do serviço público" e aprofunda o movimento de substituição de servidores concursados por "vínculos precários". As entidades classificam a inclusão do artigo como um "jabuti legislativo" e um "grave retrocesso institucional" que antecipa, dentro do próprio MP, os efeitos da Reforma Administrativa.
As entidades ainda lembram que o MPRN já foi alvo de uma Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizada pela ANSEMP em 2016, quando o percentual de ocupação foi reduzido de 50% para 20%, e fazem uma dura acusaão de que a atual gestão do MP tenta uma manobra para "burlar o próprio STF".
Como se vê a conta não fecha no MP.